Tentarei não fazer política, mas apenas pedagogia matemática. Aristóteles, e bem, mencionou que o Homem é um animal político, pois transmite ideias e pensamentos através dos seus meios de comunicação, normalmente a oralidade ou a escrita. Todavia tentarei cingir-me à pedagogia matemática. O partido socialista, com o apoio dos partidos da esquerda que formam a denominada geringonça, pretende alterar os escalões do IRS, mormente desdobrar o segundo escalão, sem que tal afete muito a receita fiscal deste imposto, que rende ao Orçamento de Estado, cerca de 12 mil milhões de euros. Como, por opções políticas, a margem orçamental não é elevada para a redução deste imposto que incide essencialmente sobre o trabalho, e o PS pretende cumprir a sua promessa eleitoral de aumentar o número de escalões, existirá por conseguinte um problema técnico-jurídico, que me parece, que mais uma vez, revela o ardil com que este governo aborda os assuntos de natureza política. Ainda sobre o mito da progressividade e do número de escalões, recomendo ao leitor que leia este artigo que escrevi em sede própria, que demonstra, que mais escalões não implica obrigatoriamente mais progressividade. Tal é uma premissa matemática.
Caso o governo desdobre então o segundo escalão, criando um escalão adicional com uma taxa mais baixa, tal significa que todos os escalões acima desse escalão, beneficiarão com esse abaixamento, pois esse é o princípio básico de qualquer imposto progressivo. Imagine, em teoria, que há apenas dois escalões de taxação para rendimentos mensais, um de 10% até €1000 por mês, e outro de 20% a partir de €1000 por mês. Logo, alguém que ganhe €500 por mês, paga €50 de imposto, ou seja, 10%. Mas alguém que ganhe €2000 por mês, paga 10% sobre os primeiros €1000, e 20% sobre o valor restante, ou seja, paga €100 mais €200, perfazendo €300. Neste caso, a taxa de imposto efetiva será de €300 sobre os €2000, ou seja, 15%. Caso o governo; em teoria considerando este regime fiscal mencionado; desdobre o primeiro escalão, criando um escalão adicional de 5% até €500, alguém que ganhe €500 por mês passará a pagar apenas 5% de €500, ou seja, €25, ao contrário dos anteriores €50. É uma boa medida, porque as pessoas que ganham menos, passarão a pagar ainda menos. Mas tal implica obrigatoriamente, que uma pessoa que ganhe €1000, pela própria natureza do IRS, passe também a pagar apenas €25 de imposto pelos primeiros €500, e €50 pelos restantes, perfazendo €75, ao contrário dos €100 anteriores. E similarmente, alguém que ganhe €2000, passará a pagar €25, mais €50, e mais €200; ou seja, €275 em vez dos anteriores €300. Tal resulta numa taxa efetiva de €275 sobre €2000, ou seja, 13,75%, em vez dos anteriores 15%. Desdobrar o IRS, implica obrigatoriamente, pelas próprias premissas plasmadas no Código do IRS, baixar a fiscalidade para todos os escalões superiores ao escalão que é beneficiado. Tal é um princípio geral de qualquer imposto de natureza progressiva.
Mas o ministro das finanças, já veio referir que não pretende baixar a fiscalidade para os escalões mais altos, para que não haja perda de receita fiscal, e porque provavelmente os partidos da esquerda que apoiam o governo, não concordam com tal medida. Assim, das duas uma, e isto é uma premissa jurídico-matemática. Ou o governo aumenta as taxas dos escalões mais altos, para compensar a perda de receita, fazendo com que os escalões nos rendimentos mais altos paguem a mesma taxa efetiva de IRS. Neste caso, a medida terá impacto político negativo, pois, aparentemente, para a opinião pública passará a imagem que o governo aumentou os impostos, pois aumentou os valores das taxas de IRS, e conhecendo-se António Costa, homem ardiloso e advogado de profissão cuja Verdade é o seu último objetivo político, tal é pouco crível. Ou então, o governo cria alíneas e adendas ao Código do IRS, que estabelecem que para os escalões mais altos não se aplicarão as alterações fiscais dos escalões mais baixos. Mas neste caso, trata-se claramente, no meu entender, de uma medida obviamente inconstitucional, pois o artigo 104.º da constituição refere explicitamente que o imposto sobre o rendimento pessoal é único, ou seja, não pode haver dois impostos, isto é, duas curvas de taxação em função dos critérios político-ideológicos do legislador. Considerando que o tribunal constitucional, pela própria jurisprudência constitucional, está muito politizado à esquerda, e considerando o ardil nato dos membros do governo nas questões de relações públicas, parece-me claramente que o governo optará pela segunda opção, ou seja, criar um mecanismo jurídico-fiscal claramente inconstitucional, para que possa cumulativamente referir que baixou os impostos para as camadas mais baixas da população, sem afetar as taxas de IRS nos escalões mais altos de rendimentos e sem que tal afeta significativamente a receita fiscal.
Mas este mecanismo, eventualmente a adotar por parte do governo, implica obrigatoriamente de facto e não apenas de jure, a existência de dois impostos diferentes sobre os rendimentos, pois assume que para um determinado escalão de rendimentos, há duas taxas possíveis a aplicar, quando a constituição exige a unicidade do IRS. Relembremo-nos que o primeiro chumbo do tribunal constitucional ao anterior governo, foi exatamente na questão constitucional da unicidade do IRS, quando aquele tribunal entendeu, que o legislador não podia discriminar o contribuinte em função da entidade empregadora, se o estado, ou uma entidade privada. Neste caso a questão jurídica é mais subtil, porque de facto o código do IRS já discrimina o contribuinte em função dos rendimentos, mas discrimina-o ao longo de uma curva de taxa efetiva de IRS que é única. É preciso notar, que apesar de existirem escalões, o IRS é uma função contínua, ou seja, para um determinado rendimento, aplica-se uma taxa efetiva, sendo que essa relação é contínua e não discreta, mesmo que a noção de escalões possa dar a entender que existe uma discrição. E essa curva de taxação efetiva deve ser única, tal como o exige a constituição. E para a mesma curva, ao se desdobrar um determinado escalão, beneficia-se obrigatoriamente todos os escalões acima desse escalão. Não o fazer sem alterar as taxas dos escalões mais altos, é criar duas curvas, ou seja, violar a constituição. A alternativa, é aumentar as taxas dos escalões mais altos, para que a taxa efetiva de IRS seja a mesma nesses rendimentos mais altos, mas isso acarreta um problema político, pois dará a entender, que o governo aumentou impostos.
Mas este mecanismo, eventualmente a adotar por parte do governo, implica obrigatoriamente de facto e não apenas de jure, a existência de dois impostos diferentes sobre os rendimentos, pois assume que para um determinado escalão de rendimentos, há duas taxas possíveis a aplicar, quando a constituição exige a unicidade do IRS. Relembremo-nos que o primeiro chumbo do tribunal constitucional ao anterior governo, foi exatamente na questão constitucional da unicidade do IRS, quando aquele tribunal entendeu, que o legislador não podia discriminar o contribuinte em função da entidade empregadora, se o estado, ou uma entidade privada. Neste caso a questão jurídica é mais subtil, porque de facto o código do IRS já discrimina o contribuinte em função dos rendimentos, mas discrimina-o ao longo de uma curva de taxa efetiva de IRS que é única. É preciso notar, que apesar de existirem escalões, o IRS é uma função contínua, ou seja, para um determinado rendimento, aplica-se uma taxa efetiva, sendo que essa relação é contínua e não discreta, mesmo que a noção de escalões possa dar a entender que existe uma discrição. E essa curva de taxação efetiva deve ser única, tal como o exige a constituição. E para a mesma curva, ao se desdobrar um determinado escalão, beneficia-se obrigatoriamente todos os escalões acima desse escalão. Não o fazer sem alterar as taxas dos escalões mais altos, é criar duas curvas, ou seja, violar a constituição. A alternativa, é aumentar as taxas dos escalões mais altos, para que a taxa efetiva de IRS seja a mesma nesses rendimentos mais altos, mas isso acarreta um problema político, pois dará a entender, que o governo aumentou impostos.