Do modelo para o melhoramento da Democracia


Muito se tem escrito sobre os defeitos das democracias contemporâneas, e como estas aparentemente não conseguem cativar muito do eleitorado que se manifesta descontente com o regime político. Claramente, tendo em consideração os registos histórico-políticos, pode-se afirmar que o descontentamento da população perante a classe dirigente está sempre relacionado com questões de natureza económica que geram pobreza e desemprego, podendo ser acentuadas com aspetos adicionais de natureza relevante mas todavia com menor impacto, como migrações de povos culturalmente diferentes. Havendo bem-estar, pleno emprego e alto nível de vida, por norma os povos demonstram pouco descontentamento perante a classe política dirigente, independentemente dos regimes políticos em vigor. Os regimes democráticos tendem naturalmente a atenuar tais descontentamentos populares pois o sufrágio permite ao eleitorado fazer escolhas, mas muitas das escolhas que parte do eleitorado de facto prefere ver instaladas em momento de crise, são contrárias aos princípios constitucionais de um estado de direito, logo, o regime democrático não tende a resolver os problemas subjacentes a questões desta natureza. A democracia não pode tolerar que haja escolhas que sejam antidemocráticas, sob pena de o próprio regime democrático ficar posto em causa.

Todavia não mencionarei neste texto as questões de natureza económica, ou tantas outras, que provocam euforia consumista, bem-estar social ou pleno emprego; ou as suas antagónicas que por seu lado provocam pobreza e desemprego, e que são de facto os principais fatores para a insatisfação popular com o regime político e com as classes dirigentes; tentarei todavia neste texto apresentar, após reflexão, medidas que visem melhorar o regime democrático tornando-o mais imune a fenómenos que corroem o princípio da liberdade, da tolerância democrática, do pluralismo e do próprio estado de direito. No meu entender as graves falhas da democracia contemporânea representativa estão relacionadas, quer com uma visão extremamente ingénua, utópica e quase pueril do comportamento humano, quer por outro lado, com uma visão extremamente vil e maquiavélica por parte de algum setor das classes económica e política.

Julgo que as falhas conceptuais do regime democrático estão mais vinculadas ao paradigma inquestionável do modelo de sociedade ocidental, que achamos que, tal como o otimista no Cândido de Voltaire, é o melhor dos mundos possíveis. Nunca nos questionamos porque razão os fundadores da Democracia, os Gregos, não escolheram o modelo representativo, mas o direto, em que cada cidadão vota em cada decisão do executivo, mas em que cidadão é considerado apenas o homem livre maior de idade e natural da pólis. É certo que o modelo grego advém de uma visão elitista da sociedade em que apenas os melhores deviam decidir (aristo-cracia, ou seja, poder aos melhores), mas foi exatamente por terem essa visão pragmática de escolherem apenas os “melhores” e os naturais, que no meu entender, a democracia pôde ser instituída e funcionar normalmente. Todavia, mesmo no regime grego, hipoteticamente dirigido apenas pelos melhores, desde cedo surgiu nas assembleias a figura do demagogo, ou seja, o líder das massas, que num discurso carregado de pathos (emoção) e com pouco de logos (conhecimento), atraía as massas para decisões espontâneas e irracionais. Talvez devido ao argumentário que Aristóteles posteriormente plasmou nas suas obras e que de certa forma plasmava o ideário grego sobre a diferença de géneros, é que as mulheres não podiam votar. De acordo com Aristóteles as mulheres demovem-se exacerbadamente muito mais pela emoção do que pela razão, e embora a emoção popular tenha tido um papel importante para os diversos processos revolucionários que fizerem o Homem evoluir, são todavia demasiadamente prejudiciais no dia-a-dia das decisões dos poderes executivo e legislativo.

Os Romanos todavia adotaram um modelo democrático, que além do elitismo grego de apenas aceitarem homens livres e cidadãos naturais das províncias romanas, exigiram requisitos adicionais como o cumprimento do serviço militar. Em acréscimo, os Romanos entenderam que o peso de cada voto, deveria ser proporcional àquilo que cada cidadão contribui através da carga fiscal, tal como sucede hoje nas assembleias de votos dos acionistas de uma empresa. Quando muitos séculos mais tarde os Britânicos reinstauraram a democracia, fizeram-na de forma representativa, e aqui, surge no meu entender, uma das maiores hipocrisias dos tempos contemporâneos, pois os princípios subjacentes da democracia representativa, de facto, implicam que o eleitorado precisa de procuradores para os representarem nas diversas decisões executivas e legislativas.