Todos sabemos que os jornais e as televisões necessitam, por vezes, de preencher os seus espaços noticiosos com eventos menores ou menos relevantes, ou simplesmente preenchê-los com frivolidades sem relevo jornalístico, como por exemplo, o nascimento de uma qualquer cria de urso pardo num qualquer zoo algures por um país de cultura anglo-saxónica. Mas um reflexo interessante das sociedades motorizadas é a azáfama quase constante que a comunicação social dedica em torno das variações centesimais do preço dos combustíveis líquidos. Dir-me-ão que uma variação de poucos cêntimos afeta no orçamento das famílias, mas alguém que gaste por mês por exemplo oitenta euros de combustível, despende em acréscimo mais um euro por mês, quando o preço da gasolina, por exemplo, passa de 1,40€ para 1,42€, ou seja, quando sofre um aumento de dois cêntimos. Vemos esta azáfama jornalística em torno do preço do pão, do azeite ou do leite? Ou do preço do passe social? Ou dos bilhetes do comboio inter-cidades?
Assim, sempre que há variações centesimais, ou seja, de cêntimos, no preço do líquido locomotor da grande maioria de veículos do país, lá vem a ridícula e idiótica azáfama mediática em torno dessa variação centesimal, com os repórteres televisivos a fazerem aos automobilistas portugueses a queirosiana e retórica pergunta da praxe no posto de combustível, cuja resposta totalmente inesperada e aleatória, apenas se encontrará por certo no panteão dos segredos mais recônditos dos deuses: "O que é que o senhor acha deste aumento?"
Mas se formos todavia mais analíticos, apercebemo-nos que os combustíveis, de acordo com a calculadora dos custos do automóvel, representam em média apenas um terço do custo total da posse de um automóvel, aquilo que os ingleses denominam por cost of ownership. O português médio trabalha quase metade do ano, pagando 300€ por mês, em 711€ que é o salário médio líquido, para pagar as despesas totais do seu automóvel. Essas despesas são o seguro, o combustível, as revisões, reparações, possível crédito automóvel, desvalorização do veículo, lavagens, eventuais multas, IUC, portagens e parqueamento. Esse custo total ultrapassa muitas vezes os 500€ por mês, mas as pessoas não fazem essa contabilidade porque as contas que se pagam aparecem distribuídas pelo ano em diferentes parcelas.
O português médio gasta com combustíveis cerca de 90€, o que significa que uma variação de por exemplo quatro cêntimos no preço da gasolina, de 1,40€ para 1,44€, representa um acréscimo no custo mensal de cerca de 2,5€, representando esse valor menos de 1% do custo total pelo facto de se ter um automóvel. Ou seja, a azáfama mediática foca-se num aumento de apenas 1% no custo de uma parcela da mobilidade das famílias. Vemos este frenesim mediático quando existe variação de preços nas companhias aéreas, considerando que cada vez mais pessoas andam de avião, pelo menos dentro do espaço comunitário? Vemos este frenesim mediático quando há variações de preços nos passes sociais, ou nas tarifas dos táxis?
Conclui-se assim que a azáfama mediática que é dada às variações centesimais no preço dos combustíveis, é de facto, empolada e praticamente irrelevante, quer para o orçamento geral das famílias, quer também para o custo total da posse e usufruto de um veículo automóvel.
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