Necessidades de água e comida, de toda a população mundial vs. de todo o gado mundial. Fonte: cowspiracy.com |
Assim sendo, permiti-me caros leitores que estabeleça a título de exemplo alguns cálculos elucidativos. A cidade de Amesterdão, independentemente de ser conhecida pelo facto de as suas práticas venéreas e de consumo de estupefacientes estarem regulamentadas, oferece, tal é do senso comum, uma boa qualidade de vida e do espaço público aos seus habitantes, sendo que por esse motivo o preço do metro quadrado para aluguer ou compra de habitação no mercado livre, é dos mais elevados da Europa. O município de Amesterdão tem uma densidade populacional de cerca de 5000 habitantes por quilómetro quadrado, sendo que o planeta tem uma população de cerca de 7,3 mil milhões de pessoas. Concluímos que com a densidade populacional de Amesterdão, capital do país que se encontra no quarto lugar a nível global do Índice de Desenvolvimento Humano, toda a população mundial conseguiria viver com uma boa qualidade de vida, em cerca de 1,4 milhões de quilómetros quadrados, as áreas juntas de apenas Espanha, França e Alemanha, e menos de 1% de toda a superfície seca do planeta Terra.
Concluo, permiti-me a ousadia, que a tese que advoga que existe sobrepovoamento do mundo, é um dos maiores sofismas da era moderna, sendo para mim evidente, que a questão é de recursos e como eles estão distribuídos, mas também o consumo de carne e politicas económicas expansionistas baseadas no consumismo como fator propulsor do crescimento económico. Perguntemo-nos então por exemplo o que é que a cidade de Amesterdão tem de especial que outras cidades não têm, para que várias pessoas consigam viver com uma qualidade de vida bastante razoável, numa cidade tão compacta ou densa. A resposta é clarividente: enquanto na maioria das cidades do mundo, a repartição modal alocada à bicicleta é de menos de 5%, tendo Lisboa por exemplo, segundo os últimos censos do INE, cerca de 0.5%; na cidade de Amesterdão a percentagem de pessoas que usa a bicicleta para deslocações diárias chega a atingir os 60%.
Recordo que num espaço onde cabe um automóvel, cabem 9 bicicletas, e 30 bicicletas podem mover-se no espaço que exige a deslocação de um único automóvel. Os estudos relacionados com a capacidade e fluxo de tráfego, ditam que são precisas três vias de um determinado tamanho para mover 40000 pessoas através de uma ponte em uma hora fazendo-se uso do comboio, quatro vias para movê-las em autocarro, doze vias para movê-las em automóveis, e apenas duas vias para deslocá-las pedalando em bicicleta. Lisboa por seu lado, comporta diariamente 700 mil automóveis, e se os quisermos estacionar todos, considerando um lugar de estacionamento padronizado, ficaríamos com uma área correspondente à segunda maior freguesia de Lisboa.
O automóvel, sendo um autêntico sorvedouro de recursos naturais, como energéticos, de espaço ou ambientais, é por conseguinte, de facto, um dos principais sustentáculos da tese, de que o mundo está sobrepovoado e por conseguinte as instituições políticas internacionais, ficam no dever moral de proceder à promoção em larga escala de diversos métodos contracetivos para controlo populacional. Logo, necessitamos de uma economia global verdadeiramente eficiente e não baseada no consumismo desenfreado ou na denominada obsolescência programada, onde os produtos não são desenhados e concebidos para serem duradouros, mas para que alimentem um ciclo económico expansionista, que paradoxalmente, e tal é clarividente pela indústria automóvel, obedece ao mais ineficiente de todos os modelos económicos possíveis. A ineficiência deste modelo, no campo da mobilidade, pode ser plasmada a título de exemplo, num simples comparativo. No outro dia enquanto tomava café com um colega de trabalho, o mesmo confessou-me que o seu automóvel era extremamente eficiente por ser híbrido, mas perguntei-lhe cordialmente se não seria simplesmente mais eficiente alugar ou comprar uma casa a dois quilómetros do trabalho e vir de bicicleta, a usar um carro eficiente e habitar a 30 km do local de trabalho. Além disso alocar a potência de noventa cavalos para locomover um indivíduo jamais pode ser em engenharia denominado de eficiência. Compreendo a posição do meu colega pois reflete o modelo de desenvolvimento insustentável e sorvedouro de recursos que enveredámos no pós-guerra, com o denominado espalhamento urbano, onde os percursos ficaram em média, para o cidadão mediano, cada vez mais longos; ou seja, à medida que a tecnologia automóvel progredia e fazia os carros circularem em média a velocidades mais elevadas, o cidadão mediano ia habitar cada vez mais longe do seu local de trabalho, normalmente na periferia da cidade. O espalhamento urbano alimentado pela política da promoção do automóvel é de facto um sorvedouro de recursos, como energia e espaço.
Mas há de facto outros problemas mundiais, porque mesmo que a Holanda, por exemplo, seja eficiente na sua mobilidade, não é sustentável nos seus recursos, ou seja precisa de muito mais espaço por cidadão, do que aquele que a sua superfície pode comportar, e o problema principal além do elevado consumismo, prende-se também com o consumo de carne. Consta, que para produzir um quilograma de carne de vaca, são necessários em média, 15 mil litros de água, 6 quilos de colheitas e 330 metros quadrados de terreno. Por conseguinte, a abstinência, mesmo que parcial, à carne de vaca, é não só uma questão de saúde, de respeito pelos animais, mas também uma questão muito pertinente a nível ambiental, até porque a pecuária é a maior responsável pelo efeito de estufa, devido ao metano emitido pelo sistema gástrico do gado bovino. Claro que, como ambientalista, não demonizo a indústria, pois é a mesma que nos providencia muitos bens que fizeram aumentar a qualidade de vida ao cidadão comum, mas o problema é que muita da indústria, devido ao modelo económico vigente, é de facto a principal responsável pelo facto de haver teorias, aparentemente coerentes, de que o mundo está sobrepovoado. Se a tecnologia industrial for usada, para aumentar verdadeira e tecnologicamente a eficiência do sistema produtivo, num modelo unicamente pragmático e técnico, e não num modelo baseado no consumismo desenfreado de bens rapidamente perecíveis, diria, que o mundo poderia comportar muitos mais seres humanos, sem se levantar qualquer questão de falta recursos. Paradoxalmente então, as visões teológicas do mundo, coincidem parcialmente com as dos ambientalistas.
Sem comentários:
Enviar um comentário