Em todos os modelos de sociedade existem naturalmente vertentes mais primárias e outras vertentes mais racionais ou humanas. A evolução do Homem, através por exemplo da Democracia grega, concebeu modelos participativos de sociedade, onde era concedido ao cidadão direitos e deveres, que lhe conferiam poder decisório no rumo das sociedades. Por outro lado, as massas são regidas por instintos primários, que catapultados e disseminados em cadeia, podem ser perigosos para a harmonia da sociedade.
Em todos os modelos ideológicos de sociedade, do capitalismo ao socialismo, existem naturalmente vertentes primárias, mas todavia em ambos existem princípios humanos. Define-se primarismo, não no sentido pejorativo, mas estritamente científico, ou seja, referente aos instintos coletivos que eram comuns nas sociedades até ao neolítico, sociedades essencialmente nómadas. Define-se Humanismo, como os princípios racionais, lógicos e literatos, que deram lugar ao pensamento ocidental, essencialmente através do Iluminismo.
Do Humanismo do Capitalismo
A grande vertente humana que os modelos ideológicos anexos ao capitalismo trouxeram à civilização, que muitas pessoas parecem desconsiderar, foi o máximo respeito e veneração pelos direitos da individualidade. O primarismo não obedece a princípios que respeitem a individualidade considerando que o ser humano é, instintivamente, um animal grupal. O princípio grupal da espécie, tal como se aplica a um cardume ou a uma alcateia, teve o propósito ao longo de milhões de anos, de estatisticamente proteger o indivíduo através do grupo. Os modelos ideológicos ligados ao capitalismo ao se desvincularem dos conceitos grupais e ao promoverem a individualidade, incorrem em princípios humanos relacionados com o Iluminismo e o Racionalismo. Foram estas ideologias que degeneraram nos direitos das mulheres, dos homossexuais ou de outras minorias, porque deixamos de encarar o outro, como alguém que etiquetamos por pertencer ou não a certo grupo, mas encaramos o próximo como um ser individual, que tem as suas características próprias.
A categorização grupal é um mecanismo primário que o nosso cérebro utiliza, através de milhões de anos de evolução, por forma a simplificar o processo mental de reconhecimento e de organização na nossa base de dados mental das pessoas com quem lidamos. É mais fácil, do ponto de vista neuronal, categorizar certo tipo de indivíduos pela cor da pele ou pelo carro que possui, do que pelas ideologias que defende ou pelas opiniões pessoais. Para o Homo Sapiens havia apenas os da nossa tribo ou grupo que conhecíamos bem, e os outros das outras tribos, que categorizávamos em função da tribo. É ainda hoje comum, ouvirmos alguém denominar outra pessoa pela nacionalidade, característica física ou certo tipo de objeto que possui.
Os modelos capitalistas, ao defenderem a individualidade, combatem a vertente instintiva do Homem, que tende a moldar os indivíduos em função de traços comuns. É assim compreensível que sociedades capitalistas, como as que existem na Europa, deem elevada primazia a princípios como a privacidade, a liberdade individual ou a fraca ingerência do Estado nos assuntos estritamente pessoais, sendo o Estado o representante último do interesse grupal. É neste paradigma que surgem os modelos económicos do liberalismo e do neoliberalismo.
Do Humanismo do Socialismo
O Socialismo obedece também a uma dialética filosófica que Marx definiu como materialismo dialético. Como qualquer dialética, obedece a princípios filosóficos racionais sólidos que combatem os instintos. Numa sociedade tribal ou primária, existem sempre estratos sociais, camadas organizacionais da tribo, com funções e importâncias distintas, que visam garantir que a tribo ou o grupo estão providos com segurança, recursos, garantindo ainda a continuidade genética dos indivíduos da tribo. Na vida selvagem os zoólogos catalogam num mesmo grupo de primatas vários estratos sociais de machos, desde o alfa até ao zeta. O mesmo nas fêmeas, havendo fêmeas propícias para a procriação e outras apenas para tarefas menores. Na evolução do Homem, este tipo de estratificação primária foi sendo parcialmente abandonado, mas também parcialmente, de forma subtil, absorvido pelos modelos civilizacionais. Mesmo na República de Platão, considerada por muitos como o percursor clássico do socialismo, o autor estratifica a sociedade em grupos que dependem naturalmente das suas capacidades, mas atribuindo-lhes também importâncias diferentes: trabalhadores e artesãos, mulheres e crianças, guerreiros e guardiões, governantes e filósofos. Encontramos nestes grupos resquícios primários da forma tribal que o antepassado do Homem tinha na maneira de estratificar a tribo, se fizermos um paralelismo entre a tribo e a pólis. Nas tribos do Homo Sapiens existiam os que guerreavam com as tribos vizinhas, os que colhiam os frutos das árvores e as sementes, os que concebiam e tratavam dos menores, os mais sapientes que por norma eram os mais velhos, e naturalmente os líderes que comandavam.
O Socialismo, ao tentar abolir através da ideologia a estratificação da sociedade, deu um passo deveras humanitário no combate ao primarismo. O indivíduo deixa de ser obrigado a prestar vassalagem ao próximo em função de qualquer norma social ou património, como título profissional, capacidade financeira, confissão religiosa ou descendência familiar, como acontecia nas sociedades aristocráticas e na idade média, mas passa a ser um indivíduo com os plenos direitos, e igual a qualquer cidadão inserido na sociedade.
A desconsideração pelos mais fracos e desprotegidos é também algo que obedece a um instinto primário. Na tribo, por questões de sobrevivência e considerando que não havia cuidados médicos, os enfermos, os deficientes ou os menos capacitados deveriam ser simplesmente ostracizados ou mesmo abandonados, sob pena de se tornarem um fardo perigoso para a sobrevivência da tribo. Tal tinha como missão primária maximizar a produtividade da tribo e assim aumentar as suas probabilidades de hegemonia. O Socialismo ao impor um Estado Social forte e presente, que auxilia os mais desfavorecidos e os enfermos, independentemente das suas capacidades financeiras, incorre num Humanismo forte contra a corrente do primarismo das sociedades capitalistas nesta matéria. E esse auxílio, ao contrário da caridade cristã, não depende do espontâneo voluntarismo das contribuições e donativos individuais e imprevisíveis dos outros, mas do Estado Social, entidade abstrata, racional e humanitária, que auxilia os enfermos e os mais necessitados.
Do Primarismo do Capitalismo
O Capitalismo obedece todavia também a vários princípios primários, o mais conhecido sendo a competitividade. A competitividade é um termo socialmente aceite e subtil, para definir a competição primitiva das sociedades tribais, sendo a primeira das quais, a competição dos machos pelas fêmeas. A espécie, através da evolução por seleção natural, incutiu no Homem o sentimento natural da competição. Tal tinha como propósito primário, de que os mais fortes e mais hábeis, seriam aqueles que conceberiam e por conseguinte, propagariam a sua linhagem, aumentando de forma iterativa através das gerações, a qualidade (força, inteligência, capacidade de sobrevivência, habilidade) da espécie e dos indivíduos. O Capitalismo faz uso dessa pulsão primária, para que cada indivíduo entre em competição com o seu próximo, com o objetivo de cada trabalhador ser cada vez mais produtivo. Este ideal deu lugar às sociedades de consumo, e na competição subtil e inconsciente que cada um faz com o seu vizinho ou colega, na casa e no automóvel que possui ou no salário que aufere. O outro deixa de ser encarado como alguém com o qual eu posso cooperar, mas unicamente com o qual eu tenho que competir e de ser superior. Este princípio ideológico moldou, por exemplo, os espaços urbanos das sociedades modernas, desprovidas de praças ou de espaços públicos de confraternização, cingindo-se apenas a rodovias e blocos arquitetónicos desumanos. Não duvidemos que a “cidade de betão ou do concreto” é uma consequência do modelo ideológico capitalista.
A outra vertente primária está relacionada com a sociedade de consumo, reflexo das sociedades capitalistas. O instinto foi usado de forma calculista pela indústria publicitária, para que os indivíduos passassem a adquirir os bens, não numa lógica racional ou ponderada, em função das suas necessidades, mas em função dos instintos, numa lógica definida por muitos como quase libidinosa. O indivíduo adquire um automóvel, não para saciar as suas necessidades de mobilidade, mas para saciar os seus instintos, no vão hipotético desejo que assim será mais feliz, ou mesmo, que terá mais sucesso sexual ou profissional. As pessoas compram certo tipo de telemóveis, ou peças de vestuário, porque existe uma conduta social, através do primarismo coletivo e do grupo, de que se não os adquirirem serão, por esses princípios primários, excluídos e ostracizados. Este fenómeno coletivo existe nas sociedades capitalistas, por exemplo, contra aqueles que se vestem de forma diferente, que não têm certos tipo de produtos, ou que se deslocam por meios diferentes, como por exemplo de bicicleta. Este tipo de conduta primária no ato do consumo provoca elevadas assimetrias sociais, e à escala global, pobreza extrema em certas regiões do globo, assim como acentua os problemas decorrentes das alterações climáticas.
Do Primarismo do Socialismo
Embora o Socialismo não incorra numa lógica primária na aquisição de bens ou serviços, pelo contrário, incorrendo numa lógica quase monástica e cristã, de austeridade e frugalidade nos hábitos de consumo, também o Socialismo obedece a uma série de princípios primarismo, mais especificamente, tal como o capitalismo, na forma como lida com as massas. O Socialismo ao abolir a noção da individualidade em prol do bem-comum, incorre num primarismo clássico, de que o fascismo também fez uso. Os desígnios biológicos da espécie não têm em consideração as especificidades humanas do indivíduo. O grupo instintivo ou a espécie, que se manifestam no Socialismo no maior estrato da sociedade, o proletariado, sempre foram encarados como elementos chave para os processos revolucionários. É por isso que o Socialismo, e os seus movimentos derivados, por norma procura as mudanças políticas através de movimentos grupais, como manifestações ou ações em conjunto, formas primárias de aglomeração de indivíduos, onde as opiniões racionais e ponderadas são abafadas pelo instinto do grupo. Nessa lógica, o Socialismo peca também, por à luz deste primarismo, colocar em causa um dos maiores pilares do Humanismo, a Liberdade individual.
Sendo também verdade que o Capitalismo obedece a princípios muito mais materialistas que o Socialismo, devido ao frenesim das sociedades de consumo, os modelos ideológicos capitalistas, oferecem liberdade individual aos cidadãos, para professarem qualquer culto religioso. O Socialismo ao catalogar a vertente religiosa, como uma distração para as massas, como hoje acontece com o fenómeno do futebol, incorre também num materialismo dogmático, que impede o cidadão por opção livre, de enveredar por qualquer norma dita espiritual ou esotérica. Esta lógica socialista, incorre também no primitivismo do tangível, em detrimento do intangível, muito mais racional e humano.
Parece-me um artigo interessante, apesar de não concordar com uma boa parte dele. E vou por pontos, talvez tenhamos uma boa discussão, e possamos aprender alguma coisa um com o outro.
ResponderEliminar"É mais fácil, do ponto de vista neuronal, categorizar certo tipo de indivíduos pela cor da pele ou pelo carro que possui, do que pelas ideologias que defende ou pelas opiniões pessoais." - Não é por ser mais fácil, mas mesmo por uma questão de sobrevivência. Ainda hoje a principal característica para identificar espiões (ou infiltrados) no exército norte-americano é a cor da pele ou o formato dos olhos. É apenas uma forma de identificar infiltrados no nosso grupo que se querem apoderar dos nossos recursos. Era muito útil quando os humanos andavam em tribos. Daí termos uma predisposição natural para sermos racistas, xenófobos etc etc.
"mas passa a ser um indivíduo com os plenos direitos, e igual a qualquer cidadão inserido na sociedade" - Também não concordo com esta afirmação. É útil que a sociedade esteja culturalmente estratificada. Que exista uma certa hierarquia, já que os seres humanos não nascem a terem os conhecimentos e comportamentos necessários para a vida. Estes comportamentos têm de ser adquiridos, e a existência de referências na sociedade faz com que os 'novos' dêem mais atenção a essas pessoas e assim tenham uma maior probabilidade de serem bem sucedidos (Os ensinamentos dos mais velhos, os comportamentos empreendedores dos mais ricos, as restrições fornecidas pela igreja, tudo isso coloca restrições culturais úteis na formação de qualquer pessoa).
"A desconsideração pelos mais fracos e desprotegidos é também algo que obedece a um instinto primário." - Isto é falso, na minha opinião. O altruísmo é um instinto primário, e não a desconsideração. Até os golfinhos o têm, assim como os elefantes. A 'desconsideração' não tem nada de instinto primário.
"O Capitalismo obedece todavia também a vários princípios primários, o mais conhecido sendo a competitividade." - Todos os sistemas têm de incorporar a parte competitiva. O capitalismo apenas usa esta 'competitividade' para produzir valor para a sociedade, ao passo que nas tribos, a competitividade era destrutiva.
"A outra vertente primária está relacionada com a sociedade de consumo, reflexo das sociedades capitalistas. " - Capitalismo é completamente o contrário de uma sociedade de consumo. Uma sociedade de consumo era quando viviamos em tribos e se consumia tudo o que se produzia. Ora, o capitalismo só é possível quando a sociedade passa de 'consumir tudo o que produz' para poupar uma parte (e investir). Aliás, o 'porco-capitalista' como é descrito pelos socialistas é precisamente uma pessoa muito agarrada ao dinheiro que não o gasta nem por nada e que vive de rendas, ou seja é completamente a antítese de consumista.
"Este tipo de conduta primária no ato do consumo, provoca elevadas assimetrias sociais, e à escala global, pobreza extrema em certas regiões do globo." - Pobreza extrema é o que tem havido na História do Homem. O que foge à regra é a aquisição de riqueza por parte dos países ditos capitalistas (na realidade são mercantis no início). Portanto, não é nem de perto o sistema capitalista que cria pobreza extrema, muito pelo contrário.
Rodolfo
Tentarei responder por tópicos com referência aos seus parágrafos
ResponderEliminar1) Uma coisa está relacionada com a outra. É difícil do ponto de vista neuronal individualizar cada pessoa que conhemos ou com quem nos deparámos em algum momento da vida. É assim mais fácil categorizar em função de algum traço comum a outros, como traços anatómicos (cor da pele por exemplo), posses (automóvel por exemplo) ou títulos como profissão. A questão é de sobrevivência, nunca disse o contrário e sim, é evolutiva; essa evolução moldou o cérebro. Servia para identificar os nossos em oposição aos outros, que desconhecíamos e poderiam ser perigosos. Por isso os movimentos fascistas e xenófabos sempre usaram esses instintos nas massas para provocar o medo irracional e primário em relação aos estrangeiros.
2) Muitos dos instintos, apesar de estarem presentes no sistema límbico, são castrados pela ordem civilizacional do indivíduo. Referências são naturalmente necessárias, mas não têm que ser plasmadas numa sociedade hierarquizada. A referência pode advir por consenso de várias pessoas ou por eleição. As referências legais que hoje cumprimos advêm do parlamento, cujos deputados são democraticamente eleitos. Cristo foi uma referência para muitos e não tinha propriamente mais direitos que os demais.
Depende do que considera hierarquia, mas no modelo capitalista a hierarquia toma um papel muito primário, quase tribal, do líder (gestor, manager, etc.). Os exércitos são todavia ainda o lado mais primário que ainda persiste da hierarquia tribal, pois cada elemento tem uma patente própria que respeita quase sem questionar, e porquê? Porque o exército serve para fazer a guerra, aquilo que as tribos sempre fizeram desde o aparecimento do Homem. O Humanismo ultrapassa todavia essas premissas.
3) Engana-se aqui totalmente. O altruísmo não é primário, ou quanto muito é-o apenas em relação aos da nossa tribo e até um certo nível. E mesmo nos da nossa tribo, existe um limite para o altruísmo. Se o indivíduo for "irremediável", deficiente mental grave por exemplo ou em estado terminal, o instinto repele o indivíduo pois seria um empecilho na tribo. O instinto é altruísta apenas quando o indivíduo pode ser recuperado e integrado na tribo, sendo assim uma mais valia. Por isso os bebés são ternos, mesmo que abandonados e doentes. Por isso também, nos incomoda, do ponto de vista primário, quando observamos um indigente num estado lastimável, um doente grave no hospital, ou um grave deficiente mental; e fazemos um esforço civilizacional da consciência Humana para contermos esses sentimentos.
O Cristianismo foi a primeira corrente filosófica eficaz a instituir a Caridade, como contraste ao Instinto, mas os apoios aos fracos e débeis residiam em contribuições voluntárias ou seja, em donativos dos crentes. Já no século XIX o Socialismo foi bem mais longe, ao instituir racionalmente, que cada cidadão seria obrigado a contribuir para um Estado através da carga fiscal, Estado esse que auxiliaria todos aqueles que precisassem. O Estado Social é assim a Magna instituição altruística, que mais eficazmente combate o instinto do desprezo pelo próximo, mesmo que "irremediável", e independentemente da sua etnia tribal.
4) A competitividade na tribo não era destrutiva, engana-se. Tinha como função, por exemplo, que os machos ao competirem, estabelecessem qual dos dois é mais viril, forte e inteligente, para assim, de forma iterativa através de gerações, serem essas as características que seriam transmitidas às gerações futuras. O macho perdedor não era morto (o Homo Sapiens não é um felino) pois continuava a ser um ativo importante, era simplesmente assimilado na tribo, sendo um macho submisso (macho zeta). Basta analisar a organização social dos primatas para comprovar o que digo. O Capitalismo funciona através das mesmas premissas instintivas.
ResponderEliminar5) As tribos não "produziam", não confunda os períodos temporais. A produção aparece apenas com a agricultura no Neolítico há cerca de 10 mil anos e o Homo Sapiens tem 200 mil anos, sendo que o género Homo tem mais de 2 milhões de anos. O Australopitecus tem 7 milhões de anos. O Homo Sapiens e os seus antepassados sempre foram caçadores-recoletores. O Homo Sapiens muitas vezes recolhia mesmo sem precisar, porque passava por muitos períodos de carência, como o Inverno.
O capitalismo é primário porque o ser humano, quando consome, instintivamente fá-lo como se estivesse a recolher (frutos por exemplo) e ao ter na sua frente uma multitude de produtos à sua disposição, é contra-instintivo não os adquirir. A frugalidade no consumo, essa sim, é anti-instintiva.
Tentarei também responder por pontos:
ResponderEliminar(se não responder é porque concordo)
2) Repare que a hierarquia da idade medieval começou também ela por atribuir valores e títulos a pessoas que fizeram grandes feitos. Os títulos de nobreza começaram a ser dados porque efectivamente, estes homens eram 'master's' que em tempos difíceis ajudaram os camponeses a passar pelas dificuldades, até foram essenciais, e por isso eram chamados de 'nobres'. Da mesma forma, o clero começou porque alguns homens eram 'bons' e sacrificavam-se pelos outros elementos da sociedade. E penso (não tenho a certeza), que os governos devem ter-se iniciado porque algum grupo formou uma milícia e defendeu uma sociedade inteira e daí a sociedade reconhecer o seu valor. A degradação dos elementos da hierarquia não significa que esta não tenha começado de forma ilegítima. Vemos isso na democracia de hoje em dia... começam muito bem a serem eleitos, mas rapidamente perdem a legítimidade do povo e por isso andamos sempre a saltar de lado para lado. E o mesmo com o conceito de democracia.
3) O altruísmo é primário, porque é um sentimento de proximidade e 'caridade' pelas pessoas próximas, e isto quando viviamos em grupos pequenos. Não admira que quando o grupo onde nos inserimos começa a aumentar, nós traduzamos as expressões faciais como algo que nos causa dor (por exemplo ver alguém a sofrer) .. até ao ponto em que conseguimos sentir o que cães ou gatos estão a sentir apenas reconhecendo as expressões faciais, que são parecidas com o dos humanos. Repare que no caso das cobras, elas podem estar a sofrer, mas como não identificamos as expressões de sofrimento destas, não queremos saber.
E altruísmo requer sacrifício para ajudar alguém. O estado social não é nada disto, já que todas as pessoas pensam que conseguem obter algo dele, e querem contribuir com menos, daí o 'taxem os ricos'. O estado social é completamente o oposto de altruísmo, já que não é voluntário e requer o uso da força (na realidade, mesmo roubo) para funcionar.
4) O sexo é uma cooperação, isso é verdade. Mas a maneira usada antigamente para obter riqueza era apropriando-se do que era dos outros. O capitalismo muda isso, fornecendo uma forma de se obter riqueza servindo o outro.
5) Quando falo em 'produção' digo o obter os bens prontos para serem usados. Assim sendo, colher frutas e juntá-las num cesto é produzir, assim como caçar e colocar a carne pronta para comer.
O capitalismo vem inserir a negação do consumo, já que para se obter bens de capital, é preciso poupar, ou seja, deixar de consumir tudo o que se produz. Por exemplo, as tribos em África consomem tudo o que produzem, não havendo praticamente desenvolvimento económico.
Em primeiro lugar peço-lhe que hierarquize os seus próprios valores: Verdade, Ciência e apenas depois Ideologia. Não deixe que a ideologia possa deturpar a Ciência. Eu próprio reconheço virtudes no liberalismo económico.
ResponderEliminar2) Não diz nada que com o qual eu não concorde. A hierarquia é primária na medida, que o macho alfa, que por exemplo combateu de forma vitoriosa outro macho alfa de outra tribo, fez assim um grande feito e marcou uma referência simbólica para a própria tribo. Ou seja, a hierarquia é primária. Abolir a hierarquia - mesmo preservando referências, princípios e valores - é combater esse primarismo, a caminho do Humanismo.
3) O altruísmo é apenas primário até ao ponto em que o indivíduo é "aproveitável" para que seja um ativo na tribo. Por isso nos repulsa, instintivamente, doentes terminais ou pessoas com deficiências graves, e nos causa ternura bebés, mesmo que abandonados e doentes. Mesmo a piedade perante os animais, do ponto de vista primário, existe apenas naqueles que eram úteis à tribo; como o cão, que a protegia dos inimigos durante a noite. O processo de piedade e compaixão evolutivas é mais tardio no Homem, e reside no facto em que este conseguiu em si, assimilar a dor do próximo, para que pudesse viver harmoniosamente em comunidade, mas como referi, apenas em relação aos indivíduos que eram "aproveitáveis". Numa fase mais remota da evolução nem isso existiria, não fosse o Homo Sapiens ter extinto através da matança, o Homem de Neandertal, seu primo genético. Numa ilha se houver escassez de recursos e três indivíduos, sendo que um deles é mais fraco, muito provavelmente esse elemento mais fraco não receberá piedade dos outros, pois os instintos mais primários poderão sobrepor-se aos princípios evolutivos mais tardios, da piedade e da compaixão. Estes últimos surgiram numa fase, onde o Homem já vivia em grandes aglomerações de indivíduos, onde a harmonia entre todos era fundamental, do ponto de vista primário.
O Socialismo obriga assim a sociedade a enveredar por uma Piedade/Caridade/Solidariedade forçada, através do Estado Social e das contribuições fiscais, combatendo assim o primarismo.
4) Mais uma vez não nego o que diz. Mas é um facto que o Capitalismo faz uso desse impulso competitivo, para que cada indivíduo seja mais produtivo que o outro. A competição individual supera a cooperação. Na Natureza o objetivo da espécie, ao haver competição, é aprimorar-se. No capitalismo, o objetivo é a produção da sociedade.
5) Continua a confundir. A tribo funcionava por períodos sazonais. Na Primavera e Verão havia abundância e jamais se consumia todos os frutos de todas as árvores ou jamais se caçavam todos os animais passíveis de serem caçados. No Outono e Inverno havia carência. Logo, o Homem tinha uma necessidade instintiva de aglomerar (essencialmente frutos secos) o que podia obter para o Inverno, tarefa que era essencialmente das mulheres. Por isso instintivamente as mulheres são mais "caseiras" e hoje compram mais pequenos itens "mesmo não precisando", sendo que os homens, responsáveis na tribo pela caça, compram de forma objetiva itens mais onerosos, por norma de maior porte, e de forma mais esporádica (o antigo animal de grande porte que os machos da tribo caçavam).
A sociedade de consumo, com todos os seus especialistas em marketing e publicidade, toca em todos estes pontos primários para que o trabalhador use o que ganhou no mês, para consumir o que tem à sua disposição, mesmo não precisando. Por isso o consumo no Verão é maior que no Inverno. O consumismos é primário, a frugalidade é racional, pois precisamos de nos consciencializar, que não precisaremos daquele produto específico, pois felizmente vivemos numa sociedade evoluída em que não há carências no Inverno.
E não foi o capitalismo que fez o que disse. Foi o sedentarismo e o aparecimento das civilizações.
"Em primeiro lugar peço-lhe que hierarquize os seus próprios valores: Verdade, Ciência e apenas depois Ideologia. Não deixe que a ideologia possa deturpar a Ciência. Eu próprio reconheço virtudes no liberalismo económico." - Ora, eu tenho bastante a dizer sobre esta passagem. O meu primeiro valor é o respeito pelos outros, pela opinião dos outros e pelas acções dos outros. Não vou desrespeitar os outros só porque aquilo que digo é a 'verdade' ou pense que seja a verdade. Depois, digo que o conhecimento que temos não se resume ao conhecimento científico. Aliás, a grande maioria não é científico. Eu sou físico, e portanto, não digo isto de ânimo leve, mas tenho de o reconhecer.
ResponderEliminarRepare que quando o João vai almoçar, não o vai porque analisou cientificamente o seu corpo ao nível molecular e concluiu que era preciso ingerir certo tipo de alimentos. Foi a informação e o conhecimento que passou de geração em geração no seu ADN para que quando o corpo precise de recursos, o João apenas sinta um desconforto ao início, e sofrimento à medida que o tempo passa que o fará comportar-se de determinada forma para que obtenha esses recursos que o corpo precisa. Ora, isto é conhecimento incorporado no corpo, não é científico. Reparará que agora é fácil ver que a maioria do conhecimento que nos rege não é de todo científico.
O que pode ser dito para o conhecimento genético, que é transmitido de geração em geração a nível biológico, também pode ser dito para o conhecimento cultural, também ele transmitido de geração em geração (e segue um regime mais lamarckiano, já que quanto mais os progenitores se comportarem de determinada forma, mais os descendentes adquirirão esses comportamentos).
Dito isto, é de reparar que os incentivos culturais são muito importantes e vêm de experiência que confirmou que estes são bons incentivos, e portanto este tipo de conhecimento deve ser priorizado em relação a teorias científicas sociais que não foram testadas nem podem ser testadas (não se vai andar a fazer experiências com a vida das pessoas na sociedade). A União Soviética é o exemplo destas experiências científicas na sociedade, onde se rejeitou praticamente todo o conhecimento cultural e viu-se no que deu (abolição do respeito pela propriedade privada, da família, da religião, etc etc).
2) Eu neste ponto só quis dizer que o ser humano precisa de hierarquia e esta é saudável. Damos mais importância a certas pessoas na nossa vida, e a outras não. Isto é hierarquia, mesmo que voluntária. Mas ao longo das gerações, vai surgindo uma hierarquia natural e que chega a um ponto nós já nem entendemos o porquê destas hierarquias que se formaram e foram semelhantes para os vários indivíduos da sociedade, da mesma forma que o João pode não entender o porquê (cientificamente) de sentir fome e ter de comer, no entanto ingere alimentos.
3) " O altruísmo é apenas primário até ao ponto em que o indivíduo é "aproveitável" para que seja um ativo na tribo" - Isto está errado. Esta ideia nasce quando assumimos que o nosso corpo está quase perfeitamente adaptado ao ambiente que o rodeia.
No início, quando viviamos em grupos pequenos, foi desenvolvimento o 'altruísmo' e o 'caring' pelas pessoas que viviam à nossa volta e todas elas eram beneficiais para a nossa sobrevivência. Desenvolvemos portanto um processo de sinalização interno que nos possibilitava saber quando uma pessoa precisava de ajuda, quando estava em sofrimento, ou contente etc etc, e este processo foi as expressões faciais. Ora, quando a população começou a aumentar drasticamente (comparado com o que o corpo humano, a nível biológico se consegue adaptar), este processo de sinalização continua lá, mas numa nova realidade. E aplicando o processo a esta nova realidade, quer isto dizer que identificamos os sentimentos das pessoas e inclusive sentimos uma reacção a esses sentimentos que agora, nesta nova realidade (neste novo ambiente) pode não ter sentido nenhum (como sentir sofrimento por alguém que foi atacado do outro lado do globo).
Aliás, o ser humano consegue-se identificar e sofrer (ou não) ao ver caras que são feitas nas rochas ou algo do género. Daí gostarmos de arte, já que é uma forma de sentirmos sem que esses sentimentos representem uma realidade (ou jogos).
ResponderEliminar5) Quando digo 'capitalismo' não é propriamente a definição que começou com a revolução industrial, talvez venha daí o desacordo.
Outra coisa que queria referir, é que a moralidade não vem da razão, nem do conhecimento científico. O ser humano não precisa de entender a moralidade de uma forma racional, já que esta foi formada porque nos adequava ao ambiente em que nos fomos inserindo ao longo da História (e talvez pré-história). A moralidade é apenas uma parte do conhecimento que foi passando de geração em geração e que nos permitiu sobreviver e prosperar (cultural).
Mas o respeito pela opinião do próximo não invalida de todo a hierarquia que estabeleci. Estabeleci uma hierarquia de valores, Verdade, Ciência e Ideologia, exatamente porque a minha experiência me diz, que as pessoas, mormente os políticos e aqueles com visões ideológicas do mundo mais assertivas, tendem a deturpar a própria Ciência e a Verdade, em função das suas próprias visões ideológicas. Mais uma vez, neste caso, nunca disse o contrário do que agora postulou. E disse-o, pois pareceu-me, talvez erradamente, pelos tópicos que comentou, que o caro comentador tinha um pensamento liberal/capitalista muito estruturado.
ResponderEliminarConfunde Ciência com Instinto. O Instinto representa, de facto, um conhecimento milenar da espécie e da Natureza. Mas repare que por essa ordem de ideias poderíamos dizer que as plantas têm conhecimento, ou mesmo as rochas, e mesmo que o tivessem, dependendo de quão abrangente queríamos que esse conceito fosse; jamais as rochas produzem Ciência, na medida que não postulam teorias científicas. Um exemplo interessante é o da maturidade sexual. A maturidade sexual é definida em alguns manuais, nos animais, pela idade a partir da qual, o indivíduo sabe o que tem de fazer para copular, sem que para tal tenha de ser ensinado. Ou seja, é conhecimento primário milenar guardado no sistema límbico. Mas para que possamos entender como funciona o processo de fecundação, com detalhe, jamais seria possível sem a Ciência como hoje a conhecemos.
2) Mais uma vez não nego o que diz. Digo apenas, e reafirmo, que a hierarquia tem a sua raiz, na tribo e no facto de o Homem, tal como os primatas, ser um animal social e hierarquizado, sendo que naturalmente a hierarquia tinha uma função muito bem definida na tribo, que é a de estabelecer referências e de garantir que a espécie progredia através das gerações, sempre através dos melhores, mais ágeis e inteligentes, pois os líderes eram os que naturalmente copulavam. E reafirmo que o Capitalismo, ao contrário do Socialismo, mantêm muitos destes pressupostos, com o objetivo da produção, e eventualmente do progresso. Como exemplos temos a referência no líder, o individualismo ou a meritocracia.
3) Mais um ponto onde eu concordo com o que diz. Mas repare que esse "caring" e cuidado, que sim, é verdade, transmite-se muito através das expressões faciais, pois estas transmitem sentimentos, funcionou durante um largo período da evolução, como referi anteriormente, sempre com o pressuposto máximo da utilidade, e apenas aos da nossa tribo. Ou seja, numa fase remota, o indivíduo auxiliava o seu próximo, apenas quando achava que era útil fazê-lo, pois o indivíduo que recebia o auxílio era recuperável, para continuar a ser um ativo para a tribo. Caso contrário, a espécie, ensinou-nos a repudiar tais indivíduos "irrecuperáveis". Com o desenvolvimento das grandes aglomerações no Neolítico foi necessário aprimorar o cuidado ao próximo, como referiu. E foi depois primeiramente o Cristianismo através da Caridade (os leprosos dos quais Cristo não se afastava), e posteriormente o Socialismo (os meus impostos auxiliam pessoas que eu nunca vi), que combateram este primarismo, na medida que mesmo os "irrecuperáveis, que na tribo eram um empecilho" devem ser cuidados. Muitos movimentos fascistas fazem uso ainda deste instinto irracional, ao atacarem pessoas que recebem rendimentos mínimos do Estado, mesmo que no cômputo geral, esses valores representem muito pouco nos orçamentos de Estado e da Segurança Social.
Sobre Ética, Moral e Razão, recomendo-lhe que leia este texto que escrevi em tempos. Desse texto: A palavra Ética vem do grego, mais precisamente "ethos" e significava algo como "modo de ser". Quando os romanos fizeram a tradução para o Latim, surgiu posteriormente a palavra Moral. Assim Ética, Moral e Costume têm a mesma raiz etimológica. Todavia com o tempo, a terminologia foi-se alterando, e talvez devido ao facto de os romanos terem uma visão mais pragmática dos assuntos e os gregos uma abordagem mais filosófica, as palavras Ética e Moral afastaram-se do seu significado filosófico, sendo que a Ética tenta aproximar os costumes, como os das elites profissionais, à razão da ciência e da filosofia, enquanto que a Moral adota uma abordagem de maior senso comum.
ResponderEliminarInsiro-me em liberal conservador (liberal no sentido europeu claro).
ResponderEliminarBem, 'conhecimento' representa o conseguirmos adaptar as nossas acções ao ambiente que nos rodeia, de outra forma não poderíamos dizer que temos mais conhecimento que os elefantes (o elefante pode ter tanto conhecimento abstracto como Einstein, não lhe vai ser muito útil, já que não o poderá usar). Daí o nosso corpo ter conhecimento em si, pois ele 'sabe' como reagir ao ambiente exterior de forma a que possamos sobreviver.
O que queria dizer é que Conhecimento não é o mesmo que Ciência, nem só existe sob a forma de conhecimento científico.
Também queria referir que o método científico (e daí a palavra Ciência) se ajusta bem a descobertas do mundo material, descobertas essas onde a experiência pode ser concluída num curto espaço de tempo. Digo isto pois, é muito diferente fazer-se uma experiência para provar que a electricidade funciona de determinada forma, que em poucas horas é possível realizar esta experiência e verificar o resultado, com o realizar experiências (ainda que pequenas) na sociedade como um todo, em que os resultados dessas experiências podem demorar gerações a concluir-se e a verificar a validade da teoria por detrás da experiência (por exemplo a mudança da mentalidade de 'deve casar virgem' para o 'deve usar o preservativo', que não tem corrido bem, já que o número de mulheres solteiras e sozinhas a cuidar dos filhos é muito grande actualmente, e criar o filho sozinha é uma forma rápida de acabar na pobreza, já que entre estas pessoas, o índice de pobreza é substancialmente maior. Ou seja, a mentalidade de 'deve casar virgem' não era uma forma contra a liberdade da mulher, mas um meio de prevenir que essa mulher acabasse na pobreza).
Repare também que tanto a evolução darwinista biológica, como a evolução lamarckiana da cultura (o termo 'darwinismo social' não faz sentido, já que a evolução cultural faz-se pela aquisição de comportamentos por imitação, não por eliminação), como a evolução científica são processos em que há uma certa criação aleatória de ideias e depois a experiência 'decide' quais funcionam. A única diferença entre estas evoluções é o tempo da experiência. Deixe-me explicar... a evolução biológica é bastante lenta, porque já se atingiu uma complexidade grande, de forma que as 'mutações' e a probabilidade de mutações é extremamente pequena comparada com o todo. Ou seja, há um respeito natural por aquilo que já está construído e já passou a validação experimental (o que não quer dizer que agora não se ajuste à realidade) .. a evolução cultural é mais rápida que a biológica e mais lenta que a científica, mas o que um 'conservador' na sua essência defende é a conservação e o respeito por esta complexidade cultural, que já foi, também esta, validada pela experiência passada nas gerações anteriores. Isto não quer dizer que não se tenha evolução cultural, mas esta deve ser feita de forma bastante lenta, dando tempo para verificar experimentalmente a sua validade .. e a evolução científica é a mais rápida de todas, mas também a com mais capacidade destrutiva. Esta não tem uma complexidade tão grande como a biológica ou a cultural, e uma teoria científica nova pode mudar significativamente aquilo que já foi cientificamente construído. Portanto, esta pode-se dar ao luxo de ter uma evolução rápida, pois não tem uma base muito complexa que respeitar.
Agora, uma contradição acorre quando tanto os conservadores tentam aplicar a mentalidade conservadora à ciência, como os cientistas tentam aplicar a mentalidade científica à sociedade. Por exemplo, nos EUA, os religiosos a dizer que a evolução não existe e que é tudo criacionismo (quando estas coisas podem ser rapidamente experimentadas), ou então os chamados 'cientistas sociais', que são 90 e muitos por cento esquerdistas (liberal's), que tentam dar 'bitaites' sobre o que o governo deve fazer quanto a isto, ou aquilo na sociedade, quando estas pessoas tentam aplicar uma grande variação na evolução cultural, não respeitando o que já está construído. Ou seja, tentam aplicar a sua mentalidade científica à sociedade, e isso é errado em termos de metodologia. Daí eu ser conservador.
ResponderEliminarMas também sou liberal, já que eu acho que a sociedade deve evoluir mas por passos pequenos, e deve começar por determinados indivíduos a dar esses pequenos passos, e se eles tiverem sucesso, então a sociedade tentará imitar esses comportamentos para atingir o sucesso dos primeiros.
"Adquiriste muita riqueza para a tua família? então deves ficar com essa riqueza e o resto da população deve tentar imitar os teus comportamentos que te levaram a tê-la".. é assim que deve ser, e não a tirar destas pessoas para dar a outras cujos comportamentos são falhados. Uma redistribuição fará não só com que os menos bem sucedidos não adquiram os comportamentos dos mais bem sucedidos, como também uma erosão dos comportamentos que os mais pobres já adquiriram das gerações passadas que lhes permitiu chegar onde chegaram. A forma dos mais pobres saírem da pobreza, segundo um conservador, é estabelecendo hierarquias, em que existe referências na sociedade que se um pobre tentar imitar os comportamentos desses indivíduos, sairão mais prósperos (como por exemplo, ser poupado). Talvez eu possa desenvolver um pouco mais noutro post, e até dar exemplos ou factos em concreto para verificar o que digo.
Quanto ao texto, vou ver se tento ler, parece-me interessante.
Muito obrigado pela sua partilha filosófica sapiente. Aborda vários assuntos que tentarei debater.
ResponderEliminarConcordo plenamente consigo que Ciência e Conhecimento não são o mesmo. Como anteriormente referi, o Instinto representa Conhecimento, mas não Ciência. É conhecimento milenar adquirido por milhões de anos de evolução. Mas duvido todavia que um elefante tenha alguma vez a capacidade intelectual de Einstein, na medida que o seu cortex frontal não é tão complexo. O que trouxe CIência ao Homem, foi a Razão e a Filosofia (cortex frontal, que permite raciocínios abstratos), tendo Aristóteles sido um dos seus fundadores. E o que distingue a Filosofia da Ciência, é que a primeira procura a Verdade apenas através da Lógica e da Razão, enquanto a segunda faz também uso dos Factos e do Empirismo. Pois em abstrato (corrente racionalista) os factos e os sentidos podem não ser fiáveis, deturpando por conseguinte as teorias científicas. Por isso a própria Ciência evolui bastante em função das técnicas de auscultação do mundo exterior (microscópio ou telescópio, por exemplo deram grandes contributos à Ciência).
Concordo também inteiramente consigo em referência às questões cronológicas da evolução. A ciência, e principalmente os costumes das sociedades modernas de consumo, são altamente anacrónicas e estão seriamente dessincornizadas com a evolução antropológica do Homem. O Homem durante milhões de anos apenas andava a pé para se deslocar. Com a massificação do automóvel, veio o sedentarismo, que causa obesidade e doenças cardíacas. Como consequência a maior causa de morte no mundo, segundo a OMS, são as doenças do aparelho circulatório. Mas não só! A alimentação é outro caso. O Homo Sapiens na tribo raramente comia carne, apenas na época de caça, e quando conseguia em grupo caçar um animal (por isso hoje em dia, almoçar é ainda um ato social). No resto do tempo comia frutos secos, legumes selvagens ou frutas da época (por isso estes alimentos são muito saudáveis e por isso se recomenda que se coma várias vezes ao dia, peças de fruta por exemplo). Quando o Homem moderno tem a sua alimentação totalmente desalinhada com o "conhecimento milenar da espécie", para usar a sua generalização para o conhecimento (bebidas doces, excesso de carne, excesso de açucar, excesso de sal), apenas para que tais produtos vendam melhor, tal traz hecatombes enormes com doenças cancerígenas e do aparelho respiratório. Na UE, 2/3 de todas as mortes são cancros e doenças do coração.
No último parágrafo usa todavia uma visão liberal capitalista da sociedade, da qual não concordo totalmente. Repare que não sou contra a propriedade privada ou o capital, pois julgo que a existência de ambas, de forma moderada e até certo ponto, permitem a liberdade e privacidade do indivíduo (há coisas que quero que sejam sempre minhas), mas acho que na distribuição de riqueza, por questões de Justiça (a República de Platão começa pelo tópico da Justiça) deve haver rácios entre os indivíduos. Não concebo que seja justo, que alguém tenha um valor patrimonial por exemplo 10 mil vezes superior a outro alguém. E repare que a meritocracia e o incentivo ao progresso não estão propriamente relacionados com o capital que daí possa advir. Basta observar a vida de Cristo, Platão ou Gandhi. São referências da Humanidade, e não consta que tivessem tido muito património.
Ora, vou então tentar responder-lhe. Estou a gostar da troca de comentários.
EliminarJá reparei que faz muita referência a Platão em termos da sociedade, mas também deve ter em mente que Aristóteles tinha outra visão, mais liberal. Aliás, existiram muitos filósofos com várias tendências políticas, mas desses é preciso ter uma atitude muito céptica, já que como disse, a razão não tem qualquer hipótese comparada com o conhecimento cultural já formado.
Em relação ao que diz das doenças provocadas pelo desajuste entre a alimentação durante centenas de milhares de anos com a alimentação actual, devo dizer o João é um conservador. Defende que a transição deve ser feita com pequenos passos e com prudência, vendo o que está mal e voltando para trás se necessário (sempre que se estiver errado). Mas deve compreender que cada pessoa deverá tomar as suas decisões e fazer as suas escolhas, daí ser incorrecto tentar mudar o que quer que seja que os consumidores queiram pela política.
Quanto ao seu último parágrafo, eu também encontro limites para os pressupostos da teoria de livre-mercado. A sua aplicabilidade é limitada, como qualquer teoria (a necessidade da defesa da propriedade intelectual é uma limitação da teoria quando aplicada à prática). Mas como liberal, não posso deixar de referir que Justiça, para mim, não depende dos resultados finais e aposto que para o João a mesma coisa. Repare que na sua moralidade (e isto acontece com praticamente toda a gente), se for ao café beber umas cervejas com uns amigos, cada um paga a sua, não pede que se façam ajustes devido às diferenças entre o que as pessoas ganham. E se o tentasse fazer, quase que aposto que se sentiria mal ao fazê-lo. Agora, não deve tentar transpor para a sociedade uma moralidade que na sua vida quotidiana considera 'errado'. É incrível que os cidadãos deixam o Estado fazer-lhes coisas (e defendem estas acções) que não admitiriam nem mesmo ao seu melhor amigo.
E sim, é possível ser-se 10mil vezes mais produtivo que a pessoa comum. Basta pensar de outra forma, por exemplo, em Napoleão Bonaparte. Quantos soldados de infantaria valeria o general Napoleão Bonaparte? Umas contas rápidas dirá por volta de dezenas de milhares de soldados, portanto, tem uma produtividade desse valor. Hoje em dia, há pessoas com ainda mais produtividade, inseridas no mercado livre (Bill Gates).
Caro Rodolfo
ResponderEliminarObrigado pelo comentário.
Parece-me que adota uma visão ideológico dos pressupostos que temos debatido. Esqueça a ideologia que mais não serve muitas vezes apenas para servir os interesses menores do indivíduo. Banqueiros agiotas que teorizam sobre as vantagens do capitalismo, teólogos clericais a defender o cristianismo, nobres e condes a defender a monarquia, sindicalistas preguiçosos a defender as vantagens do socialismo ou pensionistas analfabetos a defender a constituição são tudo formas de menoridade intelectual, disfarçadas de ideologia, com o propósito da defesa comodista dos próprios interesses.
Foquemo-nos na Verdade, na Ética e na Ciência.
O Estado faz coisas que não autorizamos aos amigos porque o Estado representa em princípio o interesse público. Não autorizamos os amigos a passarem-nos multas quando estacionamos o carro sobre o passeio violando a liberdade individual de movimento de muitos peões.
A distribuição de riqueza ou o estado social não tem o propósito de dividir tudo por todos igualmente independentemente do que cada um produz, mas apenas garantir que aqueles que nada têm - não interessa porque motivo, preguiça ou incapacidade - têm condições mínimas de humanidade como um teto ou comida.
Eu não tenho nada contra os empreendedores ou inovadores ou os trabalhadores bem assalariados, são de saudar. Mas é questionável se o que muitos milionários auferem, considerando a miséria que há no planeta, é eticamente aceitável.
E eu sou liberal. A Liberdade é o pilar mestre dos filósofos. Transpor esse valor todavia para modelos económicos de organização da sociedade pode degenerar em muitas falácias.
Não sei qual a sua definição de 'ideologia', mas para mim esta é apenas a forma como se vê o mundo. Os exemplos que fala dos banqueiros e dos sindicalistas, isso são interesses e não ideologia.
ResponderEliminarNão autorizamos aos amigos passarem-nos multas de estacionamento porque o passeio não é 'nosso'. Se no passeio de minha casa, eu não quiser ninguém estacionado, eu não o autorizo e pronto.
Quanto à redistribuição mínima, eu até concordo com essa redistribuição para aqueles mais pobres ou mais desamparados. Mas surge ainda outra questão, é que em democracia esta redistribuição tende a aumentar (como aliás foi a história do 'estado social').
Repare que não é por existirem ricos que existem pobres, até pelo contrário. Se Bill Gates não tivesse ganho tanto, a minha vida estaria bastante pior, já que não teria tido acesso a computadores e ao Windows (ainda que numa fase em que era jovem). O pingo doce (jerónimo martins) recebe dinheiro porque as pessoas o entregam voluntariamente, todos os dias. Porque raio é que ele já tem muito dinheiro e ainda o entregam mais. A realidade é que 'riqueza' não é o dinheiro, riqueza é os bens que utilizamos (alimentos, carros, casas, mobilia etc etc). Se há gente a receber muito dinheiro pelo mercado, é porque essas pessoas entregaram muitos bens à sociedade e agora têm um papel (dinheiro) que lhes dá o direito de reclamar bens desta.
E quanto ao ser liberal e não transpor esse valor para a sociedade, não vejo então para que se seja liberal. Aliás, a economia é simplesmente o conjunto de todas as pessoas que interagem diariamente. No final de contas, tudo se resume a economia.
Caro Rudolfo, obrigado pelo seu comentário.
ResponderEliminarResponderei por pontos, mantendo a ordem dos pontos evocados no seu comentário.
1) No meu entender a ideologia tem o propósito de carregar sentimentos nos pressupostos filosóficos, para que os mesmos sejam transmitidos para os demais, como o Cristianismo, Socialismo ou o Neoliberalismo. Mas perante Filósofos, quando embrenhamos os princípios filosóficos com sentimentos, estes podem ser deturpados pela emoção. Procuremos por conseguinte a Verdade e deixemo-nos de sentimentalismos ideológicos. O caso do banqueiro e do sindicalista são emblemáticos porque falamos de pessoas que usam a ideologia para satisfazer os próprios interesses, exatamente porque falamos de interesses primários (dinheiro) tendo em consideração que a ideologia está carregada com emoções. Raramente encontrará banqueiros socialistas ou sindicalistas neoliberais, exatamente porque os sentimentos se unem, os rendimentos e a ideologia. Apenas abandonando a ideologia e procurando a Verdade, a Ética e a Ciência, conseguimos estabelecer o que é realmente Justo.
2) Exatamente por não ser nosso, por ser de todos, é que existe o Estado, que deve regular a forma como os carros estacionam no espaço público, autuando quem estaciona no passeio. Caso alguém estacione o carro mesmo em frente à sua porta, o caro Rudolfo, não pode autuar o referido condutor, por muito que isso lhe desagrade. Pode e deve sim, no exercício da sua cidadania, alertar esse cidadão que o que está a fazer é errado. Aí sim entra o dever de cidadania de cada um na participação cívica, tantas vezes mal recebida por muitos, por acharem que estamos a violar a sua liberdade individual ao alertar para alguma ilegalidade ou falta de civismo. Como bem dizia Hobbes, tudo é permitido ao indivíduo à exceção daquilo que não está legislado em contrário. E não é sua função, nem do seu amigo, multar carros sobre o passeio. Por essa ordem de ideias, regressávamos por exemplo aos modelos de justiça popular ou de impostos feudais. O Estado de Direito, permite e exige, obviamente dentro de um enquadramento legal, que o mesmo posso efetuar atos que lhe prejudiquem a si, atos que não permitiria ao seu melhor amigo. Duvido que dê ao seu melhor amigo tanto dinheiro quanto paga de impostos. Mas o Estado como disse, obedece a um enquadramento legal, por isso jamais deixaria que funcionário das finanças lhe entrasse em casa, o que deixa fazer os seus amigos. Os princípios do Estado de Direito assim o exigem, e não perceber isso é não perceber o significado de Estado de Direito, nem sequer de Estado. Ou seja, o exemplo que deu do seu amigo não tem qualquer fundamentação lógica e não faz qualquer sentido.
3) Estamos de acordo com a redistribuição. Eu não sou contra a riqueza financeira (dentro de certos limites) sou sim contra a pobreza e a indigência. Nesses limites eu acho que deve haver por exemplo rácios máximos para os rendimentos dentro da mesma organização. O CEO da galp ganha 50 vezes mais que o trabalhador que vende no posto de combustível. Embora concordando consigo que o CEO da galp, possa gerar muito mais que 50 vezes o que gera o vendedor do posto, não falamos de máquinas, mas falamos de dois seres humanos, e quando falamos de humanos, surgem invariavelmente as questões da Justiça. E nesse ponto, a questão da produtividade ou geração de riqueza de cada indivíduo, deve ser apenas um de muitos fatores diferenciadores na redistribuição de rendimentos e não o único. Por isso é que mesmo em empresa muito produtivas, com diferenciação de rendimentos, existe sempre por norma um salário base acrescido de prémios de produtividade.
4) Conhecimento também é riqueza, usando da sua generalização e se Newton não tivesse desenvolvido as suas teorias, hoje o Rudolfo andaria provavelmente ainda de carroça. Mas não consta que Newton fosse muito rico, nem que o dinheiro lhe motivasse a fazer descobertas geniais. E depois há também passos civilizacionais que ultrapassam as questões da propriedade, mas que deram grandes contributos à Humanidade no campo do Humanismo. Cristo foi um deles e não consta que fosse mais rico que os demais homens do seu tempo. Sócrates, Platão ou Aristóteles foram outro exemplo. Mas mesmo na Ciência e já na nossa era há vários exemplos. Galileu deu um enorme contributo à ciência e pouco se preocupou com a riqueza daí gerada. E outros como Gauss, Weber ou Einstein, que levavam uma vida humilde, e que se não fossem as suas descobertas o caro Rudolfo ainda viveria hoje na idade média em termos civilizacionais e tecnológicos. Ou seja, é totalmente falso, que os homens e mulheres, que maiores contributos deram à Humanidade, cientifica ou humanamente, fossem aqueles que eram mais ricos ou que para eles, o dinheiro alguma vez tenha sido factor motivador.
ResponderEliminar5) Sobre a falácia entre liberalismo económico e Liberdade, já escrevi muito sobre isso.
Atentamente