Eslava
Publicada por João Pimentel Ferreira
Da mulher eslava
não há quem me traga
uma pena na mão
para me escrever
o que me vai no coração
Da mulher eslava
que me prende e amarra
e que me revela a memória
de uma outra estória
que ouvi na ópera de Viena
de um gesto mais belo e puro
prometo que sois vós o veludo
sois vós a pena
e a trezena
Pois escrever-vos à mão
usando do coração
é escrever canhoto
é ser garanhão e potro
sois a laranja amarga e doce
sois o limão adocicado
sois o mel amargo
sois a negra rosa de inverno
sois o Cristo no Inferno
sois a pérfida mulher de César
sois a mãe de Hitler,
a mãe de Brutos
sois a ama de Átila
para um anarca
sois a Pátria.
Sois a discípula de Platão
sois a amada de um poeta
sois a Bíblia para o Corão
sois a língua de um profeta
De bin Laden, sois a mestra
em abril, sois só maio
num círculo, sois a aresta
num quadrado, sois o raio
Sois quem sois
não sois ninguém
sois o nada, sois o além
de zero a dez, sois o cem
Em percentagem, sois o mil
em binário sois o três
não há quem vos ache o percentil
sois o ano, o dia, o mês!
Sois Mulher bem o sei
Afrodite que em tempos vi
Um livro que eu já li
Na Anarquia, sois a Lei
Para Satã, sois o Cristo
para Deus, sois diabo
sois um filme nunca visto
por navegar, sois um cabo
Sois o que já fostes
nunca fostes, o que sereis
no deserto, sois as fontes
A eleita de mil reis
Sois uma boa mulher eslava
sois a minha escrava
Uma mulher sérvia
sois a minha serva
porque a tecla de um teclado
é o escape de um frustrado
Sois a eslava
e dais-me garra
Se fordes quem sonhastes
Na noite que iluminastes
não sereis quem dizeis quem sois
mas sois só o trinta e dois
Sois eslava
sois quem lava
as mágoas do passado
dos pés, por um amor pisado
Sois a eslávica tentação
Sois a lava e o escaldão
a líbido, que me escorre pela mão
Sois quem dizeis quem sois
Se fordes Mulher
há que temer?
Se fordes deusa
há que lamber
os vossos volumosos seios
por desbravar
em versos lânguidos e cheios?
Quem sois vós, Senhora?
Que El-Rei chama-vos para a ceia
Que El-Rei vos adora
e vos quer envolver em sua teia
de enredos amorosos e apaixonantes
tantos bem-parecidos galantes
que vos cortejaram
mas sois apenas de El-Rei
pois El-Rei é o Estado
consagrado
e é a Lei
Sois a eslava
Sois d’El-Rei a escrava
de um tempo que não existe
de um sonho que persiste
em erguer guindastes
e gruas
sois as luas
de Saturno
sois a lascívia
de um poeta moribundo
Sois a eslava
sois quem crava
a cruz neste Messias
sois quem escava
o sepulcro deste Cristo
NÃO!!!!
Nada disto!
Sois a eslava
que o Homem ama
sois a chama
que vigora na alma do amante
que te abraça na noite errante
sois as mãos do caminhante
e para uma prostituta
sois o evangelho mais pecante
Sois a eslava
cujo rabo deprava
o mais casto santo
sois um encanto
Sois a eslava
que me desalinhava
dos eixos meridionais
Sois as pretas boreais
És a eslava
que me crava
as unhas com paixão
no dorso que me amarra
o turbilhão
És a eslava
sou o vinho, tu és o pão
sou o meio, tu és a meia
és tu que me desbrava
o coração
sou quem te saboreia
à mão
nesta esplendorosa ceia
És tão boa, eslava
És tão livre, escrava
De Beethoven, és a oitava
De Cristo, és a chaga
És quem nunca vi
És o livro que não escrevi
Amo-te, sem te ver
Quero-te sem te querer
Coito-te, sem que te conhecer
Sonho-te, sem dormir
Como-te sem boca
E o meu Verso, põe-te louca
Abraço-te sem braços
Unimo-nos sem laços
Agarro-te sem mãos
Adoeço em versos sãos
Amo-te sem Vénus
Vejo-te sem olhos
Saboreio-te com os pés
Vejo-te com a piça
Nem Sueca nem Suíça
És a eslava que não sei sequer quem é!
Se és da Rússia ou da Guiné!
Como-te com os cabelos
cheiro-te com os pelos
tão etérea
tão volátil
tão serviçal e brava
que já nem sequer sei se és…
Eslava
Minha Senhora
seja quem fordes
seja quem comerdes
Estarei bem vivo
e se me merecerdes
viajaremos juntos
pelo cosmos
durante 14 mil milhões de anos
do Big Bang ao infinito
e que o meu grito
em forma de verso
ecoe pelo espaço tempo
e que o meu tormento
vos faça sentir aquilo que sois,
Sois todas as vacas,
eu sou todos os bois
Sois as andorinhas no outono
As folhas caducas da primavera
Sois os equinócios do verão
e as marés de Plutão
Sois os pássaros sem bico
e os pinguins do deserto
Sois um sonho desperto
sois o indigente mais rico
Sois uma águia sem asas
Uma chama sem brasas
Um planeta novo por desvendar
uma fechadura por arrombar
um código por decifrar
Vamos fecundar o universo
vamos fazer deste uno verso
um hino à fecundidade
vamos procriar matéria
vamos fecundar fotões
com Luz
vamos dar fusão às estrelas
vamos revolver galáxias
e expandir o universo
vamos ser integráveis
e diferenciáveis
vamos ser Deus
Dois num Só
Vamos ser pó!
Vamos ser Minerva
Vamos ser Diana
cacemos o Amor
de Dionísio e o seu Fervor
Platão, Sócrates e Arquimedes
Eslava
sois quem me medes
o tamanho do bastão
e nunca vos ouvi chamardes-me…..
de João
Vamos ser Pitágoras
Discursar em todas as ágoras
Vamos ser Cícero
A freira e o presbítero
Sois Maquiavel
Sois o meu mel
salgado e irrigado
com fel
És a gaja que nunca vi
que nem sei sequer se já li
se já sonhei
ou guardei
nos sonhos de outrora
és uma amora
Dai-me amor
calor
vigor
fervor
E após serdes a eslava que eu amo
és a Nádia que proclamo
És a mulher que adoro
que me abraça na madrugada,
e por quem choro!
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