Temos assistido a um ataque acérrimo à proposta da AD referente ao denominado IRS Jovem. Quase todos os comentadores políticos, desde a esquerda (Daniel Oliveira) à direita (como João Miguel Tavares ou Pedro Marques Lopes) têm atacado a proposta do IRS Jovem. A própria IL condena a proposta por esta ser selectiva. Contudo explicarei que é uma excelente medida.
Os baixos rendimentos são o impulsionador da nossa emigração
De acordo com o Eurostat, a grande maioria da população que emigra tem de facto menos de 35 anos, e não vale a pena iludirmo-nos, pois o salário é, de longe, o motivo principal para um jovem querer emigrar. Num inquérito feito aos alunos da Universidade de Coimbra, sobre quais os motivos que levam os jovens a querer emigrar, 96,3% apontou as condições salariais como fator principal para a emigração. Basta reparar aliás nas diversas migrações ao longo da história, e observar que, depois das guerras ou catástrofes naturais, os motivos económicos são o principal motivo para as migrações.
A proposta do IRS Jovem ao colocar muito mais dinheiro no bolso de muitos jovens, diminui a propensão para estes quererem sair do país por motivos económicos. Ademais o diferencial entre o salário praticado em Portugal e noutros países mais ricos da Europa é muitíssimo maior para profissões com maior especialização, como por exemplo na área das STEM, exatamente aquele grupo de pessoas que seria mais beneficiada pela proposta do IRS Jovem.
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Emigração em Portugal por idade, 2022. Fonte: Eurostat. |
Justiça intergeracional
Não me lembro que haja registos na História de Portugal de tamanha injustiça intergeracional, como a que tem existido perante os jovens do nosso tempo. Os preços da habitação subiram de forma muitíssimo superior ao valor dos salários, contudo a grandessíssima maioria do parque habitacional em Portugal é detida por pequenos particulares. Normalmente quem conseguiu adquirir habitação foram as gerações mais velhas, quando os preços estavam muito mais acessíveis e o crédito mais barato. Ou seja, as gerações mais velhas viram o seu património imobiliário sobrevalorizar com taxas muito superiores à inflação, tornando-se por conseguinte, no mesmo período, muito mais ricas que os jovens. São aliás as gerações mais velhas, normalmente e no caso do arrendamento, os senhorios das gerações mais novas.
Ademais, temos um sistema de Segurança Social que é, comparativamente, muito mais generoso para as pensões em pagamento do que será para os pensionistas futuros. O próprio PS se orgulha de ter efectuado vários aumentos extraordinários de pensões, ou seja, aumentos que desconsideram a fórmula de cálculo que tem em conta a sustentabilidade do sistema. Os nossos jovens certamente terão uma pensão que será, de acordo com previsões credíveis, apenas 40% do último salário. Aplicar uma redução de IRS geral, como propõe demagogicamente a IL, seria na prática aumentar pensões, ou seja, aumentar a despesa pública e por conseguinte a dívida, i.e., mais impostos futuros para os jovens contemporâneos. O IRS Jovem ao beneficiar apenas os jovens serviria para atenuar esta gritante injustiça intergeracional.
Por que motivo baixar IRS a toda a gente é uma péssima ideia
Se há dúvidas que o IRS discriminado por idade seja constitucional, sabemos perfeitamente que o IRS discriminado por tipo de entidade empregadora é contra os preceitos constitucionais, pois já há jurisprudência nesta matéria. O primeiro chumbo do Tribunal Constitucional ao governo de Passos Coelho foi exatamente contra a proposta do governo de então de aplicar um IRS diferenciado entre o funcionário público e o funcionário do sector privado. Isto quer dizer que baixar o IRS a toda a gente, incluindo funcionários públicos e pensionistas, implicaria, na prática e do ponto de vista orçamental, um aumento substancial da despesa pública, despesa essa que teria que ser coberta ou com mais impostos indirectos ou com recurso a dívida pública. Recordemos que há 700 mil funcionários públicos e quase 4 milhões de pensionistas.
Dir-me-ão que funcionários públicos e pensionistas também pagam impostos, mas tal é apenas um artifício jurídico-fiscal. Do ponto de vista económico e orçamental, os impostos que os funcionários públicos pagam, advêm também da colecta fiscal aplicada ao sector privado. Por conseguinte, baixar o IRS a toda a gente, implicaria um aumento muito substancial da despesa pública, muitíssimo superior ao custo que tem o IRS jovem, considerando demais que a função pública está envelhecida tendo já uma idade média perto dos 50 anos, e por conseguinte praticamente não seria abrangida pela proposta do IRS Jovem. Ademais 65,7% dos postos de trabalho das administrações públicas correspondiam a trabalhadores com 45 e mais anos, já quando consideramos funcionários com menos de 35 anos, estaremos certamente a falar de cerca de 15%. Além disso, a função pública tem um nível salarial muito superior ao sector privado, logo, incluía-la na totalidade na redução de IRS teria um custo insuportável para as contas públicas.
A IL, ao abraçar a narrativa de "baixar o IRS para todos", está a ser extremamente populista, irresponsável e muito pouco liberal, mas fá-lo apenas para tornar a mensagem política simples e eficaz.
A redução de impostos sobre o trabalho beneficia sempre quem mais ganha
Tal é uma verdade simples de atestar considerando que, pelo facto do IRS ser um imposto progressivo, é natural que quem seja mais beneficiado em termos nominais seja quem mais aufira. Mas esta crítica é tão acéfala e absurda que, levada ao extremo, poder-se-á dizer que qualquer redução de IRS é injusta, pois metade da população não paga IRS e por conseguinte nunca tem nada a ganhar com qualquer redução de IRS. Ou seja, qualquer redução de IRS beneficia sempre menos quem menos aufere. Logo, a crítica recorrente que o IRS Jovem beneficia apenas os "jovens ricos" é uma crítica sem qualquer substância.
De acordo com o INE, a despesa pública em 2023 atingiu os 112 mil milhões de euros. A proposta do IRS Jovem tem um custo estimado de mil milhões, cerca de 0,9% da despesa pública total. Não me parece irrazoável, dado o potencial beneficio que a proposta representa para o futuro do país.